O primeiro alerta foi dado a 17 de Julho no artigo do Público “Villa romana de Pisões é agora a luxuosa casa das ervas daninhas” com a assinatura do Jornalista Carlos Dias que relativamente aos trabalhos agrícolas diz:
“o que se observa revela a instalação de uma grande plantação de amendoeiras, cuja primeira fase, a preparação do terreno, implicou a lavra do solo numa profundidade que nalguns pontos expôs materiais que podem ser associados a estruturas arqueológicas. Esta actividade contraria a afirmação feita pela Universidade de Évora, que garantia estar a ser respeitada a distância mínima de 50m em redor da villa. A acção das máquinas que lavraram o terreno chegou a cerca de dez metros da vedação que a circunda.”
O segundo alerta veio da parte do Arqueólogo Miguel Serra na entrevista ao Diário do Alentejo, à data de 28 de Julho.
“Trabalhos agrícolas estão a destruir património associado à villa romana”
Mas só no passado dia 8 de Outubro, (volvidos quase 3 meses) tomei conhecimento, mediante novo artigo do jornalista Carlos Dias do Jornal Público que de pouco ou nada valeram os alertas, pois os trabalhos agrícolas continuaram e por conseguinte o Património Arqueológico identificado (protegido!) bem como de outro possivelmente não identificado ou catalogado, terá sido mesmo destruído.
“Ponte romana e sítios arqueológicos destruídos para plantar amendoal”
“Direcção Regional da Cultura do Alentejo pediu ao Ministério Público e à Direcção Geral do Património Cultural a suspensão dos trabalhos em Beja, mas a movimentação de terras prossegue.”
Ontem, dia 17 de Outubro (exactamente 3 meses após a data do primeiro alerta), deparo-me com uma outra notícia, desta vez através da Lusa, onde para além da Investigação que o Ministério Público estará a promover, torna-se conhecimento público que a queixa crime que originou esta investigação foi apresentada pela Direcção Regional de Cultura do Alentejo no dia 31 de Agosto, após duas tentativas infrutíferas de contacto com a empresa responsável – a De Prado Portugal.
“Ministério Público investiga alegada destruição de sítios arqueológicos em Beja”
“O Ministério Público (MP) está a investigar a alegada destruição de vários sítios arqueológicos durante operações de movimentação de terras, feitas por uma empresa para plantação de um amendoal numa herdade do concelho de Beja.”
Poderão alguns achar que apenas nos resta lamentar, partilhar a culpa, que não há elementos de relevantes, que mereçam um debate mais profundo ou apuramento de responsabilidades.
Pelo contrário. Há e são demasiadas pontas soltas e vários detalhes a merecem reflexão.
Do meu ponto de vista, estamos a falar de responsabilidades partilhadas por 3 entidades que ultimavam um Acordo de Colaboração, aprovado em reunião de Câmara no dia 17 de Maio de 2017 (consultar acta) e posteriormente formalizado a 24 de Agosto entre a Câmara Municipal de Beja, a Universidade de Évora e a Direcção Regional de Cultura do Alentejo para a salvaguarda e gestão da Villa Romana de Pisões, onde foi ainda apresentado um Plano de Ação para esta Villa Romana que contempla as áreas da Arqueologia, Geofísica Aplicada, Ciências Agrárias, investigação em Arqueometria, Ciências do Património, Conservação e Restauro, Arquitetura e Artes Visuais bem como a área da Arquitetura Paisagista, Museologia e Tecnologias Digitais.
Vejamos:
- Se a Direcção Regional de Cultura do Alentejo que terá tomado conhecimento atempado da situação, e decidiu agir, porque é optou por uma queixa crime, quando podia ter requerido uma Providência Cautelar – um procedimento simplificado e de natureza urgente, com vista à suspensão dos trabalhos agrícolas que estavam a colocar em risco o Património Arqueológico?
- A Universidade de Évora, que para além da responsabilidade de ser uma das partes do Acordo de Colaboração é a proprietária da Herdade da Almocreva, onde fica sediada a Villa Romana, é responsável pela adjudicação dos terrenos (concurso?) à empresa De Prado Portugal “em regime de responsabilidade solidária” (de acordo com o que encontrei no portal da DRE 1 ha = 525 €/ano era o preço base do concurso), empresa que não só destruiu Património Arqueológico como não terá agido de acordo com contrato celebrado. Se por um lado a Universidade de Évora pretende salvaguardar, por outro permitiu a exploração agrícola desenfreada de uma cultura e colocou em causa o mesmo património que se propôs salvaguardar.
- E a Câmara Municipal de Beja, ficou até hoje em silêncio absoluto, limitando-se a assistir à destruição do nosso Património Arqueológico que está identificado (e protegido!) no Plano Diretor Municipal em vigor, enquanto acenava aos Bejenses o Protocolo que visaria reabrir Pisões ao Público.
Um Plano Diretor Municipal (Lei n.º 31/2014 de 30 de maio – Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo) não é apenas um conjunto de directrizes e plantas à escala do Concelho. Após aprovação e entrada em vigor um PDM é para respeitar e para fazer cumprir (o que não invalida a sua constante revisão para acompanhar as necessidades do território).
Questões que importa responder:
a) Teve a Câmara Municipal de Beja conhecimento ou ou não?
b) Se teve, então porque é que nada fez?
Do meu ponto de vista, temos duas instituições que distam mais de 80 km do local em causa e essa distância afeta diretamente a sua articulação e capacidade de resposta.
Por outro, temos a Câmara Municipal que a pouco mais de 10 km do local, poderia de forma célere ter reagido atempadamente e requerido uma Providencia Cautelar de forma a parar os trabalhos Agrícolas, para que se salvaguardasse o Património Arqueológico agora destruído.
Caso o anterior executivo tenha tomado conhecimento e nada tenha feito para impedir a destruição do Património Arqueológico, estamos perante um caso de negligência? Em caso afirmativo, poderá o anterior executivo ser alvo de um processo por negligência?
Não estamos numa altura em que se exige mais da nossa classe política e se pedem responsabilidades políticas?
Autor(a): Luís Palminha
Humanista, Criativo, apaixonado pela 7ª Arte, Fotografia e Arquitectura, é também entusiasta das IT’s. Durante a Licenciatura em Arquitectura de Gestão Urbanística, encontrou nas Cidades e no Território, um novo ímpeto guiado pelo constante desafio de mudanças de paradigmas.
(De momento encontra-se a concluir a Tese de Mestrado em Urbanismo)